ECONOMIA

Governo discute o preço da gasolina nesta segunda-feira

São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro. O Ministério de Minas e Energia (MME) estuda a criação de uma política de amortecimento de preços dos combustíveis que chegue ao bolso do consumidor, como antecipou O TEMPO no domingo (3). Nesta segunda-feira (4), técnicos do MME e do Ministério da Fazenda, que integram o grupo de trabalho criado para discutir o assunto, têm reunião marcada. Estão incluídos na discussão os combustíveis derivados do petróleo, como a gasolina.

O acordo firmado com os caminhoneiros para o fim do movimento de paralisação define a redução de R$ 0,46 no preço do diesel nas bombas. Agora, a intenção é incluir na conversa os demais combustíveis, criando um mecanismo que proteja o consumidor do sobe e desce dos preços.

Auxiliares do presidente Michel Temer, destacados para acompanhar esses estudos, disseram que a solução em estudo não pretende ser definitiva. É um “plano de transição”, que deve garantir uma previsibilidade nos preços da gasolina até outubro, quando o novo presidente eleito deixará clara sua posição sobre como devem ficar os preços da Petrobras.

Segundo o MME, o grupo de trabalho vai convidar especialistas para ajudar a construir uma solução que permita, por um lado, a continuidade da prática de preços livres ao produtor e importador e, por outro, o amortecimento dos preços ao consumidor. A primeira reunião do grupo ocorreu na última sexta-feira, com participação de técnicos da Agência Nacional do Petróleo (ANP).

“Queremos fazer com que o consumidor não tenha mais de enfrentar aumentos diários na gasolina. A ideia é estabelecer reajustes mensais, calibrando na parte dos impostos a diferença no valor cobrado pela Petrobras, que seguirá praticando sua política de preços”, disse uma fonte que integra o grupo criado para discutir o tema. “(Essa política de proteção) terá que preservar a atual prática de preços de mercado para o produtor e importador, o que é tido pela atual administração como um ponto fundamental para a atração de investimentos para o setor. Vai trazer previsibilidade e segurança ao consumidor e ao investidor”, diz a pasta em nota.

Política lucrativa. Desde 2016, a Petrobras segue uma política de variação do preço dos combustíveis que acompanha a valorização do dólar e o encarecimento do petróleo no mercado internacional. Com os reajustes, no início de maio a Petrobras anunciou um crescimento do lucro líquido de 56,5% no primeiro trimestre deste ano, em relação a igual período do ano passado, atingindo R$ 6,96 bilhões. O crescimento expressivo surgiu depois de quatro anos seguidos de prejuízos e de um processo de reestruturação e de redução do endividamento da companhia, que teve início após as denúncias da Lavo Jato.

Bananas

Para Christopher Garman, do Eurasia Group, a política de preços da Petrobras era a maior preocupação dos investidores estrangeiros. Entendia-se que havia chance alta de mudança no próximo governo. “Mas a precariedade desse modelo quebrou-se antes mesmo da eleição”, disse. “Nos EUA, o Brasil está sendo visto, mais uma vez, como uma república das bananas. O investidor já sabe que nada vai acontecer até as eleições”, afirmou James Gulbrandsen, da NCH Capital.

O plano

A ideia em estudo é estimar um preço médio para a cotação do barril de petróleo, de US$ 60, por exemplo, e passar a adotar um regime flutuante de tributação. Se o preço do barril ultrapassar esse patamar, os impostos serão reduzidos. Já se o valor do barril baixar mais, a carga tributária poderá subir para compensar as perdas de arrecadação dos dias em que o valor esteve alto. Os governadores serão chamados a colaborar, com corte no ICMS.

Minientrevista

Bernard Appy

Economista

Diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCIF )

São Paulo. Qual é a relação entre o protesto dos caminhoneiros e o nosso sistema tributário?

Medidas tributárias não deveriam ser usadas para resolver uma questão conjuntural como essa. Se tivéssemos um bom sistema tributário, não estaríamos discutindo tributação como forma de resolver esse problema. O fato de termos um sistema tributário que só tem exceção, não tem regra, ajuda muito a ficar tentando procurar soluções tributárias para uma crise dessas.

Sem reforma tributária estamos sujeitos a ter novas paralisações como essa?

Não temos tantos setores que têm essa capacidade de tornar o país refém como os caminhoneiros. Mas abre a possibilidade de que se comece a fazer greve para reduzir tributos de um produto específico. Isso existe porque o Brasil tem essa profusão de alíquotas, tratamentos diferentes por produtos, multiplicidade de tributos. Duvido que uma crise dessas seria solucionada desta forma em outros países. Temos um problema de fundo no Brasil, que é o fato de que nós discutimos tributo por setor. Tributo deveria ter uma regra igual para todo mundo.

Como o senhor avalia as medidas anunciadas pelo governo no último dia 31 para compensar a redução do diesel?

Uma parte é redução de Cide e PIS/Cofins naquilo que vai ser compensado pela reoneração da folha, e o resto é subvenção para que a Petrobras opere com preço mais baixo. O governo até poderia ter feito uma parte sem compensação com crédito extraordinário, que é quando se abre um crédito através de uma medida provisória em situação excepcional, calamidade, crise. É um pouco o caso, mas o governo adotou medidas para compensar essa perda de arrecadação. Houve cortes de despesas, algumas medidas de arrecadação e a redução de benefícios.

São medidas adequadas?

Eu vejo um lado positivo. O governo poderia dizer que isso não precisaria ser compensado do ponto de vista do teto dos gastos, mas quis sinalizar que não vai permitir uma piora das contas públicas e adotou as medidas de redução de despesas e de redução de desonerações. É uma sinalização de compromisso com as metas fiscais e sustentabilidade fiscal.

Mas tirar benefícios de outros setores sem aviso prévio também é ruim?

É ruim porque o governo está acabando com benefícios do dia para a noite sem previsibilidade. Há empresas que fizeram investimentos em cima disso. Não sou a favor desses benefícios, mas as empresas fizeram seus planejamentos.

Nos bloqueios de estradas, os caminhoneiros argumentavam que, se o diesel baixasse, isso beneficiaria a todos porque faria cair o preço do tomate.

Não tem almoço grátis. Se você pega uma conta que é privada e joga para o governo, o contribuinte vai pagar. Uma parte grande do que será concedido aos caminhoneiros levou a uma piora do resultado fiscal porque o governo está compensando via cortes de gastos e redução de benefícios fiscais. Se tinha condição de cortar gastos, então tinha condição de reduzir a carga tributária antes. Além disso, há um efeito negativo para a economia. Vai levar a juros mais altos, o que é ruim para o contribuinte. Outra coisa: a decisão de instituir tabelamento do frete e reservar 30% dos serviços de frete da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para os autônomos é uma medida que reduz a competição no mercado de frete. E isso, no longo prazo, significa frete mais caro. Quem paga é o contribuinte. E, finalmente, tem o custo da desorganização da economia no período da greve.

O TEMPO

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